O próximo passo do mercado regulado de carbono é operacionalizar o SBCE (Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa), que foi instituído pela legislação publicada no fim do ano passado. O mercado aguarda a criação do Plano Nacional de Alocação, que viabilizará a implementação do SBCE por meio da definição de parâmetros e limites para cada período de cumprimento das metas de redução de emissões dos gases de efeito estufa.
“A lei prevê a criação desse plano até dezembro do próximo ano, mas, com a COP30 sendo realizada aqui no Brasil, a expectativa do mercado sempre foi de celeridade. Sem o Plano Nacional de Alocação, que define uma taxonomia, não há como operacionalizar o mercado regulado de carbono, o que significa que ele não funciona efetivamente, apesar de existir no papel”, destaca Erica Perin, sócia-líder de Impostos Diretos e ESG Tax da EY, que participou do webcast “Desafios e Oportunidades do Mercado de Carbono no Brasil” feito pela EY
Ainda segundo a executiva, a lei definiu a interoperabilidade do SBCE com outros mercados de carbono, inclusive internacionais, o que também fica inviável enquanto não estiver efetivamente operando. “Há várias possibilidades de interoperabilidade previstas como a integração entre o SBCE e registries internacionais e a facilitação da transição de créditos voluntários para o sistema regulado como CRVEs (Certificados de Redução ou Remoção Verificada de Emissões), desde que sigam metodologias credenciadas, além de permitir a transferência internacional de resultados de mitigação (ITMOs) com validação nacional”, completa. Outros benefícios da interoperabilidade incluem evitar a dupla contagem, garantindo que um mesmo crédito de carbono não seja usado por mais de uma parte ou país, e incentivar a liquidez, facilitando a negociação de créditos brasileiros em mercados externos, o que amplia demanda e valor.
Busca pela conformidade já começou
De qualquer forma, ainda que o mercado regulado de carbono não esteja em operação, as organizações precisam se preparar desde já. Na legislação aprovada no fim do ano passado, ficam obrigadas a apresentar plano de monitoramento e relato anual ao órgão gestor as empresas que emitem mais de 10.000 tCO2e/ano (toneladas de dióxido de carbono equivalente por ano). Já as empresas que emitem mais de 25.000 tCO2e/ano terão a obrigatoriedade adicional de realizar a conciliação periódica de obrigações, ou seja, entrega de CBEs (Cotas Brasileiras de Emissões) ou CRVEs para compensar suas emissões. “Há diversas penalidades previstas para a não conformidade como perda de benefícios fiscais, subvenções e acesso a linhas de financiamento públicas”, diz Perin.
Para Thais Fontanello, gerente sênior de cadeias de suprimento resilientes e sustentáveis da EY Brasil, que também palestrou no webcast, o SBCE, ainda que careça do Plano Nacional de Alocação, já inaugurou uma era de responsabilização climática ao longo de toda cadeia. Isso porque as empresas reguladas precisarão monitorar, reportar e reduzir suas emissões, com as cadeias de valor passando a ser ativos estratégicos na jornada de descarbonização. “A legislação aprovada exige a compensação para o Escopo 1, mas ainda assim, por uma questão de reputação e compromisso assumido pelas empresas perante os stakeholders, como os investidores, os outros dois escopos acabam sendo contemplados pelo negócio”, explica.
Por fim, Leonardo Dutra, sócio-líder de serviços de mudanças climáticas e sustentabilidade da EY Brasil, alerta que os setores econômicos, embora sejam muito distintos e impactados de forma diferente pelas mudanças climáticas, estão avaliando os riscos de maneira muito semelhante, de acordo com a última edição do estudo Nature Risk Barometer, produzido pela EY. “Isso sugere que falta um olhar mais apurado por parte das organizações, analisando de fato as possíveis implicações das mudanças climáticas para a continuidade das operações e sustentabilidade do negócio”, finaliza.