Em um movimento considerado inovador no mercado voluntário de carbono, o banco britânico Standard Chartered anunciou um acordo com o governo do Acre para comercializar até cinco milhões de créditos de carbono jurisdicionais oriundos da preservação florestal no estado.
A venda de carbono refere-se à comercialização de créditos de carbono, instrumentos que representam a compensação de uma tonelada de dióxido de carbono (CO₂) ou gases equivalentes que deixaram de ser emitidos ou foram removidos da atmosfera. Esses créditos são gerados por projetos ambientais, como reflorestamento, conservação de florestas ou uso de energias renováveis, e podem ser vendidos a empresas ou países que buscam cumprir metas de redução de emissões — seja por exigência legal (mercado regulado) ou de forma voluntária (mercado voluntário).
Na prática, a venda de carbono permite que emissores, como grandes indústrias ou instituições financeiras, compensem parte de suas emissões financiando projetos ambientais em outras regiões. Trata-se de um mecanismo de mercado para incentivar práticas sustentáveis, internalizando os custos ambientais da poluição.
No Brasil, esse tema tem ganhado destaque, especialmente com iniciativas em biomas como a Amazônia, onde há grande potencial de geração de créditos por meio da preservação florestal.
De acordo com a Reuters, o contrato firmado entre o governo do Acre e o banco britânico terá validade de cinco anos e início previsto para 2026, com potencial de gerar até US$ 150 milhões em receitas, o equivalente a cerca de R$ 810 milhões na cotação atual. Ademais, 72 % dos recursos líquidos gerados serão destinados às comunidades locais e indígenas, que foram incluídas na fase de consulta iniciada em maio de 2025.
O Standard Chartered, um dos maiores bancos comerciais do Reino Unido, será responsável por vender os créditos no mercado voluntário global, atendendo a empresas e instituições que buscam compensar suas emissões de carbono de forma voluntária. A atuação de uma instituição financeira nesse tipo de contrato marca um avanço significativo na relação entre o setor bancário e a transição para uma economia de baixo carbono.
O banco britânico enfatizou que adotará um processo rigoroso para garantir que esses créditos sejam de alta qualidade ambiental, ou seja, que cada crédito represente, de fato, a redução de uma tonelada de carbono.

Para o direito bancário, trata-se de um novo tipo de operação híbrida, que combina estruturação financeira, obrigações ambientais e cláusulas de repasse de benefícios socioeconômicos. Além disso, a presença de um banco comercial nesse ecossistema exige compliance rigoroso, gestão de riscos reputacionais e garantias de que os créditos possuem integridade ambiental comprovada — o que pode abrir espaço para novos modelos de financiamento climático e securitização de ativos ambientais.
Tal medida ganha ainda mais destaque e contrasta com a iniciativa de outro estado da Região Norte, o Pará, que obteve manifestação contrária do Ministério Público Federal. Nesse caso, o acordo envolvia contratos de venda antecipada (forward sale) de créditos de carbono, o que é proibido, segundo o MPF, pela lei que regula o mercado de carbono no Brasil
O MPF emitiu uma recomendação defendendo sua anulação, com base no argumento de que o contrato infringiria a Lei nº 15.042/2024, que proíbe, de forma expressa, a negociação antecipada de créditos de carbono oriundos de programas REDD+ nos âmbitos estadual e federal.
Já o acordo com o Acre não envolve pré-venda de créditos, o que aumenta sua transparência e legalidade. Ademais, os recursos não compõem o orçamento do estado e serão obrigatoriamente investidos em políticas públicas de controle do desmatamento, e, como dito, do total arrecadado, 72% será destinado às comunidades locais e indígenas.
“O contrato entre o Acre e o Standard Chartered inaugura um novo capítulo na relação entre bancos, estados e meio ambiente. Para além do potencial financeiro, a operação estabelece um precedente jurídico e institucional relevante para futuros arranjos que envolvam o setor bancário na estruturação e comercialização de créditos de carbono. Com governança robusta e compromisso com a inclusão social, o modelo acreano pode servir de referência para o desenvolvimento sustentável aliado à inovação financeira”, diz Guilherme da Costa Ferreira Pignaneli é sócio no escritório Ernesto Borges Advogados, atua na área de Legal Operation.