terça-feira, julho 29, 2025

Adaptação climática: a urgência que ganha espaço na COP30

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Nos últimos anos, a adaptação às mudanças do clima não ocupou o centro das atenções nas Conferências das Partes (COPs). No entanto, a expectativa é que esse cenário mude na COP30, que será realizada em Belém, em novembro. O motivo é claro: o aquecimento global acima de 1,5 °C e a intensificação dos eventos climáticos extremos estão ocorrendo mais rápido do que previam os modelos climáticos.

As enchentes no Rio Grande do Sul, em 2024, são um exemplo emblemático. Os impactos sociais, econômicos e ambientais foram devastadores. E esse não foi um caso isolado. Segundo levantamento da Fecomercio-SP, seis em cada dez empresas paulistas relataram ter sido afetadas pelos efeitos adversos da mudança do clima em 2024.

Além dos prejuízos imediatos, há riscos crescentes para a segurança alimentar. Um estudo recente publicado na revista Nature aponta que culturas essenciais como milho, soja, arroz, trigo e mandioca podem sofrer perdas significativas até o final desse século. A estimativa é de uma redução de até 120 calorias por pessoa por dia para cada 1 °C de aquecimento adicional na temperatura média da Terra — um dado alarmante que evidencia o impacto direto sobre populações e cadeias produtivas em todo o mundo.

Embora as ações de mitigação – que estão relacionadas à redução das emissões de gases de efeito estufa — continuem sendo fundamentais, o cenário atual exige que governos e empresas também priorizem estratégias de adaptação. Isso significa implementar medidas que reduzam a vulnerabilidade de sistemas naturais e humanos aos efeitos já visíveis da crise climática como: o desenvolvimento de uma infraestrutura urbana resiliente, sistemas de alerta precoce mais eficientes e práticas agrícolas adaptadas às novas condições climáticas.

Para que esses esforços sejam conduzidos de forma eficaz, existem alguns desafios, e o financiamento dos projetos de adaptação é o mais abordado, principalmente quando falamos dos países em desenvolvimento. Faz sentido que seja assim. Os atores da agenda climática têm buscado caminhos, apesar dos impasses sobre quem paga a conta, por meio de mecanismos globais, como o Fundo de Perdas e Danos, e nacionais, como o Fundo Clima.

Mas gostaria de chamar a atenção para outro ponto essencial: a dificuldade no desenvolvimento de indicadores de adaptação. Indicadores são importantes por trazerem padronização e possibilitarem o monitoramento do progresso de planos e metas. Diferente das emissões de gases de efeito estufa, que são mais facilmente contabilizadas e possuem soluções que podem ser replicadas de forma global, as ações de adaptação são mais específicas e possuem um caráter mais local, o que dificulta sua mensuração e escalabilidade.

Com o intuito de endereçar a questão, o Global Goal on Adaptation (GGA) foi estabelecido no Acordo de Paris, em 2015, com foco na promoção de ações de adaptação mais efetivas, mensuráveis e monitoráveis, abarcando tanto o setor público quanto o setor privado. Para operacionalizá-lo, foi instituído o UAE–Belém Work Programme, que visa desenvolver indicadores e metodologias para medir as metas estabelecidas no GGA. A expectativa é que o Programa avance na COP30, com a definição de até 100 indicadores que apontarão o progresso das ações de adaptação em diferentes escalas.

Outra iniciativa proeminente que deve ser abordada na COP30 é o AdaptaCidades, lançado em fevereiro de 2025 pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), com apoio dos Ministérios da Ciência, Tecnologia e Inovação e Cidades. O programa busca fortalecer as políticas de adaptação e resiliência climática, promovendo a integração e a articulação entre governos em nível nacional e local.

Cabe lembrar que a agenda de adaptação não é responsabilidade exclusiva dos governos. Empresas, instituições financeiras e outras entidades privadas têm papel fundamental na gestão de riscos climáticos, no financiamento de projetos e no desenvolvimento de soluções inovadoras. Ao agir, protegem simultaneamente seus ativos, as pessoas e o meio ambiente.

Depois de anos em que mitigação e adaptação eram tratadas como agendas separadas, a COP30 promete uma abordagem mais integrada. As cartas do presidente André Corrêa do Lago já sinalizam essa mudança de postura, promovendo uma visão prática e colaborativa entre as partes a respeito das duas temáticas.

Para enfrentar a crise climática de forma estruturada e justa, é essencial que os temas e os atores públicos e privados estejam juntos nas rodadas de negociação. A adaptação finalmente começa a ocupar o espaço que merece.

Melina Amoni, doutora em Geografia, Gerente de Riscos Climáticos e Adaptação da WayCarbon e tem mais de 10 anos de experiência na liderança de projetos ligados à análise de riscos climáticos e planos de adaptação para empresas e governos.

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