Somente 5% dos conselhos de administração têm supervisão direta sobre natureza e biodiversidade, destacando uma lacuna no pilar de governança das empresas, aponta a Nature Risk Barometer, pesquisa anual da EY que analisa relatórios de empresas em 10 setores nos Estados Unidos, Canadá e América Latina, incluindo o Brasil, com base nas 14 recomendações da TNFD (Taskforce on Nature-related Financial Disclosures). A TNFD é uma iniciativa de alcance global dedicada à gestão e transparência de riscos, permitindo que organizações e instituições financeiras identifiquem, avaliem, gerenciem e comuniquem seus impactos, dependências, riscos e oportunidades vinculados à natureza.
Por outro lado, o relatório também aponta progressos nas práticas empresariais voltadas à natureza, com 27% das 369 empresas avaliadas no relatório integrando a biodiversidade em suas agendas de sustentabilidade. Apesar disso, ainda há margem na inclusão do tema nas estratégias corporativas mais amplas. Na gestão de riscos, observa-se o uso de cenários para avaliar ameaças ambientais, mas esses riscos ainda não são plenamente incorporados às estruturas de governança. Em métricas e metas, 43% das empresas já divulgam indicadores ambientais, com foco em água, desmatamento, reflorestamento e espécies ameaçadas.
“É positivo ver avanços em áreas como biodiversidade e métricas ambientais, mas ainda estamos longe do nível de governança e transparência que o cenário exige. O objetivo desse relatório anual é incentivar a colaboração entre os setores e oferecer um panorama do estado atual dessas divulgações, avaliando seu alinhamento com a estrutura da TNFD”, diz Leonardo Dutra, sócio-líder de Mudanças Climáticas e Sustentabilidade da EY Brasil
Outra lacuna observada é que as pontuações de alinhamento são muito mais baixas do que as pontuações de cobertura, 19% e 75%, respectivamente. Nesse contexto, é importante diferenciar os conceitos de cobertura e alinhamento em relação à estrutura da TNFD. A cobertura indica que a empresa forneceu algum nível de informação para cada uma das 14 recomendações da TNFD, independentemente de sua qualidade. Já o alinhamento examina a consistência e a qualidade dessas divulgações, considerando o grau de detalhamento e a aderência às diretrizes propostas pela TNFD.
No geral, 94% das empresas avaliadas estão relatando pelo menos uma recomendação da TNFD. Isso representa um aumento de 87% em relação à edição inaugural em 2023. No entanto, os níveis aos quais uma empresa abordou todas as recomendações da TNFD em suas divulgações, independentemente da qualidade das informações fornecidas, variam entre as três regiões: EUA (66%), Canadá (72%) e América Latina (89%).
“Um dos motivos por trás do aumento da cobertura e do alinhamento na América Latina é a crescente valorização do capital natural que tem impulsionado investimentos baseados em ecossistemas. Apesar do interesse crescente das empresas, esses mercados ainda são limitados a alguns países da região e persistem debates sobre sua eficácia, mantendo o tema em destaque nas agendas dos líderes empresariais”, explica Dutra.
Setores que lideram as divulgações relacionadas à natureza
O relatório da EY analisa também as tendências setoriais e regionais das divulgações corporativas relacionadas à natureza, com foco em 10 setores: Bens de Consumo, Extrativos e Processamento de Minerais, Financeiro, Alimentos e Bebidas, Saúde, Infraestrutura, Transformação de Recursos, Serviços, Tecnologia e Comunicações e Transporte.
Em termos de divulgação da TNFD, empresas do setor extrativo e de processamento de minerais, historicamente associadas a danos ambientais e criticadas por suas práticas, hoje lideram as divulgações relacionadas à natureza conforme a estrutura da TNFD, demonstrando uma mudança significativa em seu posicionamento e transparência, 91% de cobertura das recomendações e 27% de alinhamento. “O destaque do setor extrativo e de processamento de minerais nas divulgações sobre a natureza pode ser resultado da intensa pressão por maior transparência e ações proativas, o que levou essas empresas a adotar relatórios voluntários, além das exigências legais, impulsionando seu protagonismo em relação aos pilares da TNFD”, afirma Leonardo.
As empresas de alimentos e bebidas estão logo atrás, com suas médias sendo as segundas maiores, 88% de cobertura e 24% de alinhamento. “Devido à complexidade e visibilidade de suas cadeias de suprimentos, empresas do setor de alimentos e bebidas têm intensificado ações para mitigar riscos ambientais, como desmatamento e uso inadequado de recursos naturais. Além disso, estão se adaptando a novas exigências regulatórias, como a legislação proposta pela União Europeia que demanda comprovação de que seus produtos não contribuem para o desmatamento”, comenta o executivo.
Por fim, dentre os 10 setores avaliados no barômetro, as organizações de serviços financeiros foram as de menor classificação no que diz respeito às recomendações da TNFD, apenas: 26% de cobertura e 8% de alinhamento. “Aqui vale reforçar que o estudo foca no que é publicado pelas empresas seguindo o framework do TNFD. Para esse setor especificamente, as resoluções do Banco Central e do ISSB abordam mais a parte climática, que embora tenha correlação com biodiversidade/natureza são temas distintos”, finaliza Dutra.
Sobre o estudo: O Nature Risk Barometer é uma publicação anual da EY que analisa relatórios de empresas em 10 setores com base nas 14 recomendações da TNFD (Taskforce on Nature-related Financial Disclosures) e que são divididas em quatro pilares: 1. Governança, 2. Estratégia, 3. Gestão de riscos e impactos e 4. Métricas e Metas. O barômetro de 2024 estendeu seu escopo para 369 empresas dos Estados Unidos, Canadá e América Latina.