terça-feira, junho 10, 2025

Baixa emissão de carbono na siderurgia: utopia ou realidade próxima?

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A siderurgia, historicamente, é uma das indústrias mais intensivas em emissões de carbono, responsável por cerca de 7% das emissões globais de CO₂, de acordo com a Worldsteel Association. Com o avanço do Acordo de Paris e a crescente pressão por metas de neutralidade até meados deste século, surge uma questão: descarbonizar a siderurgia é uma utopia ou uma realidade próxima? A resposta, embora complexa, indica um cenário cada vez mais factível, especialmente diante da evolução tecnológica e do potencial brasileiro nesse contexto.

Grandes grupos siderúrgicos internacionais já definiram compromissos de redução de emissões, estabelecendo metas para 2030 e mirando a neutralidade líquida até 2050. No entanto, o percurso para alcançar esses objetivos requer uma profunda transformação, que envolve o desenvolvimento e a adoção de tecnologias disruptivas, mudanças estruturais nos processos produtivos e investimentos significativos. O hidrogênio verde é frequentemente apontado como uma solução definitiva, sobretudo como agente redutor nos altos-fornos, substituindo o carvão mineral. Mas, seu uso em larga escala ainda enfrenta obstáculos importantes relacionados à competitividade econômica, infraestrutura e disponibilidade em diferentes mercados, especialmente fora dos centros industriais mais desenvolvidos.

Diante dessa realidade, soluções alternativas, tecnologicamente maduras e economicamente viáveis, tornam-se protagonistas. O Brasil, por sua vez, possui um diferencial competitivo, que é a possibilidade concreta de substituir o carvão mineral pelo carvão vegetal renovável, oriundo de florestas plantadas e manejadas de forma sustentável. Essa abordagem, se conduzida sob rigorosos padrões ambientais e associada a certificações de origem, transforma um processo historicamente emissor em uma operação de baixíssima pegada de carbono. Além de mitigar as emissões, essa rota produtiva fortalece a bioeconomia nacional, gera empregos em áreas florestais e promove o desenvolvimento sustentável de territórios, especialmente no interior do país.

Naturalmente, além do uso de biomassa renovável, a jornada para uma siderurgia de baixas emissões passa também pela incorporação de outras tecnologias complementares. A eletrificação de processos com base em fontes renováveis é um caminho promissor para reduzir ainda mais a pegada de carbono das operações. A captura e armazenamento de carbono, por sua vez, surge como solução estratégica para processos que, ainda hoje, dependem de fontes fósseis e cujas emissões são difíceis de eliminar completamente. A busca por eficiência energética, apoiada pela digitalização e automação dos processos produtivos, permite otimizar o consumo de recursos, reduzir perdas e, consequentemente, minimizar emissões. A economia circular também desempenha papel fundamental nesse contexto,  com o incremento do uso de sucata metálica como matéria-prima, diminuindo a necessidade de novos processos redutores e contribuindo para a sustentabilidade da cadeia como um todo.

O Brasil possui condições únicas para liderar a transição para uma siderurgia de baixas emissões. O país conta com vasta disponibilidade de terras para florestas plantadas, detém expertise reconhecida internacionalmente em manejo florestal sustentável e dispõe de uma matriz elétrica majoritariamente renovável, fator essencial para a eletrificação dos processos industriais. Além disso, temos capacidade tecnológica comprovada na implementação de processos baseados em biomassa e um mercado interno expressivo, que combinado à força exportadora do setor, oferece condições ideais para escalar soluções sustentáveis e competitivas para o mercado global.

O fortalecimento de políticas públicas que reconheçam e valorizem essas práticas sustentáveis, que estimulem mecanismos de precificação de carbono e que ampliem o acesso a financiamentos verdes, pode acelerar significativamente essa transição. Se trata de uma oportunidade econômica e de uma responsabilidade estratégica: o Brasil pode, e deve, assumir protagonismo global na descarbonização da siderurgia.

A baixa emissão de carbono no setor siderúrgico, portanto, já não é mais um tema restrito ao campo das utopias ou das especulações futuras. Ela é uma realidade tangível, em plena construção, sustentada por iniciativas pioneiras que demonstram, na prática, que é possível conciliar produtividade e preservação ambiental. O desafio global, naturalmente, é enorme, mas a experiência brasileira comprova que existem caminhos viáveis, sustentáveis e competitivos.

Neste momento, a pergunta que devemos fazer não é se a descarbonização da siderurgia será possível, mas quem está efetivamente disposto a liderar essa transformação. O Brasil reúne todas as credenciais para assumir essa liderança global, e nós temos o orgulho de mostrar ao mundo que é plenamente possível produzir aço com responsabilidade, inovação e visão de futuro.

Sandro Raposo, Diretor de Sustentabilidade e Novos Negócios da Aço Verde do Brasil.

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