Enquanto o mundo corre contra o tempo para conter os efeitos da crise climática, uma tecnologia tem despontado como peça-chave no quebra-cabeça da descarbonização: a captura de carbono. Mais do que uma tendência ou promessa futura, essa estratégia já está em curso e pode redefinir a maneira como indústrias e governos lidam com suas emissões — especialmente em setores de difícil transição, como siderurgia, aviação e geração de energia.
Reduzir emissões é importante. Mas o desafio global de manter o aquecimento abaixo de 1,5°C/ano exige remover o carbono que já está na atmosfera. E é aí que entram as tecnologias de captura e armazenamento de carbono (CAC), que funcionam como grandes “aspiradores de CO₂”, extraindo o gás de chaminés industriais ou diretamente do ar, para depois armazená-lo ou reaproveitá-lo.
Essa tecnologia, que há poucos anos parecia cara demais ou futurista, está ganhando corpo. Em 2023, o mercado global de CAC movimentou mais de US$5 bilhões, de acordo com o Global CCS Institute. A previsão é de crescimento acelerado nos próximos anos — e com razão: o próprio Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) reconhece que a remoção de carbono será indispensável para atingirmos as metas estabelecidas do Acordo de Paris.
Três frentes vêm se destacando no setor. Imagine uma usina instalada no meio do nada, sugando CO₂ diretamente da atmosfera. Empresas como a Climeworks, na Islândia, operam instalações capazes de capturar milhares de toneladas de CO₂ por ano. A meta é remover 1 milhão de toneladas até 2030. O grande desafio? Tornar esse processo mais barato e menos dependente de energia.
Uma outra forma, já mais consolidada para lidar com o carbono capturado, é injetá-lo em formações geológicas profundas, como campos de petróleo esgotados. No Brasil, a Petrobras tem testado esse método no pré-sal, em uma iniciativa chamada “Carbono Zero”. Já nos EUA, o projeto Petra Nova, no Texas, é referência internacional e mostra que armazenar carbono de forma segura é tecnicamente viável — mas ainda em baixa escala.
A terceira frente vem em forma de um questionamento. É possível que em vez de armazenar o carbono, o transformasse em produtos úteis? Essa é a lógica do chamado carbono utilizável e fico feliz em dizer que já existem processos que convertem CO₂ em concreto, combustíveis sintéticos e até em bioplásticos. A Carbon Clean, por exemplo, desenvolve sistemas que o capturam diretamente em fábricas e o transformam em matéria-prima para indústrias químicas.
Apesar do entusiasmo, a jornada da captura de carbono ainda é cheia de curvas. Os custos são altos, a infraestrutura é escassa e o retorno sobre o investimento nem sempre é imediato. Sem políticas que incentivem os investimentos e colaboração internacional, o risco é de que a tecnologia fique restrita aos grandes players.
No entanto, o tempo é um fator que pode virar esse jogo. À medida que o mundo se aproxima das metas climáticas e percebe que reduções voluntárias não serão suficientes, soluções como a CAC tendem a ganhar tração — especialmente em países com matriz energética limpa e capacidade tecnológica, como o Brasil.
Mais do que uma resposta à emergência climática, a captura de carbono começa a se mostrar um caminho de inovação e competitividade. Por isso vemos que setores inteiros estão sendo redesenhados com base no princípio da neutralidade de carbono, e quem sair na frente terá mais espaço em um mercado global que cada vez mais valoriza emissões líquidas zero.
Por fim, a tecnologia sozinha não salvará o planeta — mas pode ser um pilar decisivo para garantir que tenhamos um. E agora que ela deixou de ser apenas teoria, talvez seja hora de tratá-la como parte do presente.
Gabriel Amadei, Gerente Comercial da Corning na América Latina e Caribe.