O Brasil está diante de uma oportunidade histórica de alinhar crescimento econômico à sustentabilidade ambiental. Com esse pano de fundo, o Ministério da Fazenda recebeu oficialmente, nesta terça-feira (16), o relatório “Pontos de Virada para a Transformação Ecológica no Brasil”, elaborado pelo Instituto AYA e pela Systemiq em parceria com o UK Pact e mais de 200 organizações da sociedade civil e setor produtivo. O documento detalha como cadeias produtivas estratégicas podem ser aceleradas por meio de políticas públicas e instrumentos financeiros inovadores, com o objetivo posicionar o país como líder na transição verde.
Desde 2023, o Ministério da Fazenda lidera a coordenação do Plano de Transformação Ecológica, integrando diferentes órgãos do governo federal e parceiros da sociedade civil. O secretário-executivo adjunto da pasta, Rafael Dubeux, destacou que está é hoje uma prioridade integrada às agendas tradicionais do governo. “A ideia é canalizar recursos públicos e privados para setores intensivos em inovação e baixo carbono, que também geram mais equidade na distribuição de renda. Estamos destravando valor em cadeias que já existem, mas que estavam subaproveitadas por falta de instrumentos adequados. A transformação ecológica no Brasil é uma alavanca de oportunidades, não um sacrifício econômico”.
A agenda inclui marcos legais importantes – como os do hidrogênio de baixo carbono e dos combustíveis do futuro – e também instrumentos inovadores, como o programa EcoInvest, que protege projetos verdes da volatilidade cambial.
Carolina Grottera, diretora de Programa da Secretaria Executiva do Ministério da Fazenda, complementou: “O papel do plano de transformação ecológica é desenvolver instrumentos que viabilizem soluções para essas cadeias que estão aqui mapeadas. Então podem ser instrumentos fiscais, tributários, regulatórios, instrumentos de inovação financeira, como o ECo Invest, ou como é o caso das debêntures de infraestrutura, debêntures incentivadas, ou instrumentos, regulatórios como é o mercado de carbono.”
Para o recém anunciado como embaixador da Sustainable Business COP, Paul Polman, ex-CEO da Unilever, referência global em negócios sustentáveis e membro do board da força de tarefa de apoio ao plano de transformação ecológica, já existe uma compreensão sobre a necessidade de fazer a transição, mas a mesma só pode acontecer quando os benefícios são evidentes. E o Brasil está especialmente bem posicionado para conduzir esse cenário e já é uma liderança do Sul-Sul.
“Essa é uma oportunidade que o Brasil não pode perder. É um país neutro, beneficiado pelos recursos necessários para a transição ecológica: matriz energética limpa, biodiversidade única, capacidade agrícola e minerais estratégicos”, afirmou. “O mundo não precisa de mais promessas, mas sim de planos com ação concreta.”
Polman destacou que, diante de um cenário de tensões geopolíticas e guerras tarifárias, a construção de cadeias produtivas sustentáveis e resilientes é mais urgente do que nunca. “Essa transição só será bem-sucedida se mostrarmos que ela gera prosperidade. O Brasil pode provar isso ao mundo. Há uma compreensão clara de que essa mudança é necessária, mas ela é difícil de fazer. A liderança só virá com coragem e visão estratégica.”
A estratégia também deve mirar, também, a inserção internacional do Brasil como fornecedor estratégico em cadeias globais de valor de baixo carbono. “Num cenário de guerra tarifária e geopolítica instável, o Brasil aparece como um contramovimento positivo, capaz de promover a reglobalização sustentável”, pontuou Patricia Ellen, presidente do Instituto AYA e co-fundadora do AYA Earth Partners.
Relatório mostra onde e como Brasil pode ser competitivo
Realizado com apoio de mais de mil especialistas e 200 organizações envolvidas, o relatório “Pontos de Virada para a Transformação Ecológica no Brasil” detalha os setores com maior potencial para gerar empregos, aumentar o PIB e reduzir emissões, propondo mecanismos financeiros e políticas públicas voltadas à inovação, transição energética e desenvolvimento regional.
“Na primeira fase, já mostramos que o Brasil pode adicionar cerca de 430 bilhões de dólares por ano ao PIB até 2030, com a criação de mais de 10 milhões de empregos. Agora, entramos no detalhamento técnico: como fazer isso. Quais são os gargalos, onde estão os talentos, quais instrumentos de financiamento e formação precisam ser ativados”, explicou Patrícia.
Entre os exemplos citados, está o setor de baterias para veículos elétricos. “O Brasil tem energia limpa e lítio. A pergunta é: vamos apenas exportar o minério ou vamos também produzir células de bateria, agregando valor e criando empregos qualificados?”, questionou. O relatório traz uma resposta: sim, desde que haja políticas industriais claras, estímulos à inovação e apoio regionalizado para capacitação profissional.
Ela também destacou o caso do SAF (Combustível Sustentável de Aviação), em que o Brasil pode ocupar até um terço do mercado global se investir corretamente em tecnologias como a fermentação de etanol de segunda geração e o uso de biomassa de plantas nativas como a macaúba. “Esse plano tem CEP. Ele mostra onde estão as oportunidades e onde estão as pessoas que podem aproveitá-las. A transformação ecológica precisa ser territorializada para ser real.”
Para as próximas etapas, Patricia anunciou que o Instituto AYA entregará também uma ferramenta digital que permitirá ao governo e aos investidores identificarem geograficamente onde estão os pontos de virada mapeados. Na nova fase, ainda serão trabalhados temas como diplomacia climática, green jobs e green trades.
Brasil como modelo de prosperidade sustentável
Paul Polman reforçou o potencial transformador da abordagem brasileira: “O que está sendo feito aqui pode virar modelo para o mundo. Não é só sobre cortar carbono, é sobre construir uma economia mais resiliente, mais justa e mais competitiva. E se o Brasil conseguir mostrar que isso é possível — que crescer, incluir e descarbonizar são objetivos compatíveis — ele se tornará líder legítimo do novo desenvolvimento global.”
Com o lançamento oficial do relatório, o governo brasileiro reforça sua posição no centro das discussões climáticas e econômicas globais, de olho na COP30 e nos desafios da próxima década. O Brasil, com seu capital natural e humano, pode se tornar não apenas uma referência ambiental, mas um modelo de prosperidade verde inclusiva para o mundo.