A crise climática é um dos maiores desafios globais da atualidade, exigindo uma resposta coordenada e multifacetada. Como parte de seu compromisso no enfrentamento dessa crise, o Brasil promulgou a Lei Federal nº 15.042, em 11 de dezembro de 2024, instituindo o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE). Esse sistema estabelece a base para o mercado regulado de créditos de carbono no Brasil, trazendo implicações econômicas, jurídicas e operacionais significativas para as empresas.
Este artigo analisa detalhadamente a nova legislação, seus impactos e como as empresas podem alinhar-se às regulamentações climáticas internacionais, incluindo o Acordo de Paris e as políticas ambientais da União Europeia, que influenciam cadeias globais de suprimentos.
Para compreender a relevância da nova lei, é fundamental conhecer o funcionamento do mercado global de carbono, que se divide em mercados regulados (de conformidade) e mercados voluntários.
O Acordo de Paris, adotado em 2015, é a base da governança climática global e estabelece metas para limitar o aquecimento global a bem abaixo de 2°C, com esforços para restringir o aumento da temperatura a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais. Cada país signatário, incluindo o Brasil, comprometeu-se a reduzir as emissões por meio das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs).
A União Europeia (UE) lidera as iniciativas climáticas mundiais, contando com o Sistema de Comércio de Emissões da UE (EU ETS), o maior mercado de carbono do mundo. A UE também criou o Mecanismo de Ajuste de Carbono na Fronteira (CBAM), que impõe restrições a importações baseadas nas emissões de carbono associadas à produção dos bens.
A Lei Federal nº 15.042/2024 fortalece o compromisso do Brasil com o Acordo de Paris, aprimora sua governança climática e abre novas oportunidades econômicas por meio do comércio de créditos de carbono.
Principais Aspectos da Lei Federal nº 15.042/2024
A nova legislação impõe diversas obrigações para as empresas, incluindo:
· Elaboração de inventários de emissões;
· Submissão de planos de monitoramento.
· Relatórios anuais de emissões e remoções de GEE;
· Compensação das emissões por meio de CBEs (Cotas Brasileiras de Emissão) ou CRVEs (Certificados de Redução ou Remoção Verificada).
Embora a conformidade com o SBCE possa gerar novos custos regulatórios, também traz oportunidades econômicas, como a possibilidade de venda de créditos de carbono excedentes e a chance de posicionar empresas como líderes em sustentabilidade.
Segundo o Artigo 2º, VII da lei, créditos de carbono são ativos transacionáveis, com natureza jurídica de fruto civil no caso de créditos de carbono florestais de preservação ou de reflorestamento – exceto os oriundos de programas jurisdicionais ou negociados em Bolsa de Valores, representativo de efetiva retenção, redução de emissões ou remoção, nos termos dos incisos XXX e XXXI deste caput, de 1 tCO2e.
Instrumentos de Mercado e Mecanismos de Comércio
O SBCE introduz ativos fungíveis para facilitar o comércio de emissões, tais como:
Cotas Brasileiras de Emissão (CBEs) – Representam o direito de emitir 1 tonelada de CO₂ equivalente e podem ser negociadas em bolsas de valores;
Certificados de Redução ou Remoção Verificada (CRVEs) – Representam a remoção ou redução de GEE e podem ser transacionados no mercado internacional.
Além disso, o Artigo 10 determina que todos os ativos do SBCE devem ser registrados no Sistema de Registro Central para garantir sua oficialização e transparência.
O SBCE foi concebido para ser interoperável com mercados de carbono internacionais, como o EU ETS, o que permitirá que créditos de carbono brasileiros sejam reconhecidos e comercializados globalmente, aumentando a liquidez e eficiência do mercado.
Fases de Implementação e Obrigações Regulatórias
Diferentemente dos mercados voluntários, o SBCE será implementado de forma gradual, em cinco fases. As empresas sujeitas à regulação deverão:
· Elaborar inventários de emissões;
· Submeter planos de monitoramento para aprovação regulatória;
· Reportar anualmente suas emissões e remoções;
· Compensar suas emissões com CBEs ou CRVEs ao final de cada período de conformidade.
A não conformidade com as exigências de reporte e compensação poderá resultar em multas, restrições e sanções administrativas, conforme o arcabouço de fiscalização ambiental do Brasil.
Embora os impactos do SBCE sobre as empresas só sejam completamente compreendidos após a regulamentação detalhada, há ações que podem ser tomadas desde já, incluindo:
· Elaboração de inventários de emissões e monitoramento interno;
· Avaliação de riscos e oportunidades na cadeia de suprimentos;
· Engajamento com stakeholders e órgãos reguladores;
· Investimentos em capacitação interna para gestão de carbono.
Empresas que se anteciparem às exigências regulatórias e se prepararem para a interoperabilidade com mercados internacionais poderão obter vantagens competitivas e novas oportunidades de negócios.
A Lei Federal nº 15.042/2024 representa um marco na governança climática e regulatória do Brasil. Ao criar um mercado estruturado de carbono, o SBCE fortalece a posição do país no cenário global, gera incentivos econômicos para a redução de emissões e promove a integração do Brasil nos mercados internacionais de crédito de carbono.
As empresas devem agir desde já para garantir conformidade, reduzir riscos regulatórios e aproveitar novas oportunidades de mercado na transição para uma economia de baixo carbono.
Luciana Camponez Pereira Moralles, especialista da área Ambiental e Regulatória do escritório Finocchio & Ustra Sociedade de Advogados.