quarta-feira, dezembro 4, 2024

Como a tecnologia pode salvar a vida das pessoas que moram em áreas de risco 

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No Brasil cerca de 50 milhões de pessoas ainda vivem em condições de vulnerabilidade social e econômica, o que se traduz também em vulnerabilidade estrutural e ambiental. Comunidades de baixa renda frequentemente ocupam áreas sem infraestrutura básica, expostas a riscos de deslizamentos, enchentes e outros eventos climáticos extremos que colocam suas vidas e patrimônio em constante ameaça. 

Em um cenário de urbanização desordenada e mudanças climáticas intensas, a inovação tecnológica e a aplicação de tecnologias emergentes tornam-se fundamentais para enfrentar esses desafios e promover um desenvolvimento urbano sustentável e inclusivo – e o mais importante, evitar mortes.

Posso afirmar que a tecnologia é uma das ferramentas mais poderosas para transformar a realidade das áreas vulneráveis. A aplicação de soluções voltadas para mitigação de riscos e desenvolvimento sustentável não só contribui para reduzir a exposição dessas comunidades a desastres, mas também promove inclusão, dignidade e oportunidades de crescimento.

Todos sabemos que no período de chuva – que normalmente compreende de dezembro a março no Brasil – anualmente temos notícias extremamente tristes sobre vidas perdidas por conta de algum desastre natural. A questão é que hoje já temos tecnologia suficiente que permite evitar essas mortes, retirar as pessoas do local antes que aconteça qualquer desastre.

Se tecnologias de monitoramento e análise geotécnica já provaram sua eficácia na prevenção de deslizamentos e na detecção precoce de condições de risco, a pergunta que fica é como ainda não estamos massificando esse uso. 

Segundo dados do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), cerca de 8,2 milhões de brasileiros vivem em áreas suscetíveis a deslizamentos e inundações. Isso revela um campo fértil para a inovação: sensores que identificam deformação do solo, por exemplo, podem ser instalados para monitorar a estabilidade de encostas, alertando sobre condições de risco iminente. Essa tecnologia, se aliada a sistemas de alerta que informem a população local em tempo real, pode salvar vidas e prevenir tragédias.

Outra tecnologia que pode ser utilizada é o uso de imagens de satélite e drones para monitoramento aéreo, que são capazes de mapear mudanças na ocupação do solo e detecção de áreas de risco. A coleta de dados geoespaciais possibilita análises em um curto prazo e permitem o planejamento de intervenções estruturais com foco na segurança da população. Organizações e governos podem acessar esses dados para desenvolver planos de manejo urbano mais eficazes e direcionados às necessidades locais, promovendo segurança e sustentabilidade.

Quando falamos de inovação para áreas vulneráveis, precisamos ir além do imediatismo e olhar para o desenvolvimento de soluções acessíveis que transformem a qualidade de vida dessas populações a longo prazo. Exemplos inspiradores de tecnologia aplicada incluem o desenvolvimento de moradias a partir de materiais sustentáveis e de baixo custo e estruturas reforçadas com fibras vegetais, que aumentam a resiliência das edificações a intempéries e, ao mesmo tempo, reduzem o custo de construção. Em tempos de COP29, é inadiável falarmos sobre sustentabilidade ecológica e também social.

Um estudo do Banco Mundial apontou que para cada R$1 investido em infraestrutura resiliente em áreas de risco, há uma economia de até R$7 em custos de reconstrução pós-desastres. Esses dados evidenciam o impacto positivo da inovação em soluções habitacionais e de infraestrutura comunitária que sejam adaptadas ao clima e às condições locais.

Entretanto, a inovação tecnológica não pode se limitar ao campo da infraestrutura física. É fundamental que as comunidades também tenham acesso a recursos digitais e capacitação, preparando os moradores para um mundo cada vez mais conectado e digital. Programas de inclusão digital em comunidades de baixa renda, como o acesso a smartphones e a internet de qualidade, além de capacitação para o uso dessas tecnologias, são essenciais para promover a inserção no mercado de trabalho digital e ampliam as possibilidades de geração de renda para os moradores dessas regiões, ajudando a combater a vulnerabilidade econômica que perpetua o ciclo de exclusão.

Com o avanço das fintechs, há uma oportunidade crescente para que os moradores de áreas vulneráveis tenham acesso facilitado a serviços bancários, crédito e programas de financiamento de baixo custo, essenciais para a construção de uma vida mais estável e para investimentos em melhorias na infraestrutura de suas próprias moradias.

A implementação de tecnologia e inovação em áreas vulneráveis não é uma responsabilidade exclusiva dos governos, mas demanda a colaboração entre setores. Parcerias público-privadas, o envolvimento de ONGs e empresas com compromissos claros com ESG são fundamentais para assegurar que os investimentos em tecnologia cheguem a quem mais precisa. Precisamos sempre lembrar que o ESG anda em conjunto. É impossível olhar só para uma das letras de forma isolada, mas é isso que temos mais visto.

Essas parcerias podem viabilizar o financiamento de projetos de longo prazo e fomentar o desenvolvimento de soluções sustentáveis e adaptadas à realidade dessas comunidades.

Um exemplo é a instalação de sistemas de captação de água da chuva, que podem ser financiados por parcerias e são essenciais para áreas sujeitas a escassez de água e, paradoxalmente, também para aquelas em risco de enchentes. Essas soluções integram sustentabilidade com viabilidade econômica, resultando em uma infraestrutura resiliente e eficaz.

A inovação e a tecnologia aplicada são chaves para transformar a realidade das comunidades vulneráveis no Brasil. Com soluções bem projetadas e que levem em conta as particularidades das áreas em questão, é possível não apenas reduzir o impacto de eventos climáticos, mas também abrir novas oportunidades para o desenvolvimento socioeconômico dessas populações.

A longo prazo, é preciso que nós, líderes empresariais e especialistas, continuemos promovendo o uso da tecnologia de maneira inclusiva, ética e sustentável, e que as políticas públicas avancem na direção de assegurar que os frutos da inovação cheguem a todos. Afinal, a transformação dessas áreas não é apenas uma questão de infraestrutura; é um investimento no potencial humano e no futuro do nosso país.

Luciano Machado, CEO da MMF Projetos de Infraestrutura.

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