Sancionada em 24 de julho de 1991, a lei federal nº 8213 – artigo 93, popularmente conhecida como Lei de Cotas para Pessoas com Deficiência, completa 33 anos em 2024. A legislação determina que as empresas com mais de 100 funcionários obedeçam ao percentual que varia de 2% a 5%, de acordo com número de empregados. De 201 a 500 funcionários a cota para pessoas com deficiência é de 3%, de 501 a 1000 funcionários, cota de 4% e, de 1001 em diante, a cota é de 5% dos funcionários.
Passados 33 anos, o cenário vivido no Brasil aponta para a necessidade de um olhar atento para melhorias, que resultem na garantia dos direitos das pessoas com deficiência. Como ilustração, o Estado de São Paulo, que possui o maior Produto Interno Bruto (PIB) do país, reúne 15 mil estabelecimentos com obrigatoriedade, por terem 100 ou mais funcionários, de cumprir a Lei de Cotas. Atualmente, o Estado tem o potencial de preencher 415 mil vagas, porém, apenas 189 mil encontram-se efetivamente preenchidas. Outras 216 mil vagas não foram ocupadas.
Por conta do perfil das empregadoras paulistas, o Estado responde por um em cada três estabelecimentos do país com obrigatoriedade de ter ao menos um profissional contratado por meio da Lei de Cotas. O país conta ao todo com 43,9 mil estabelecimentos, com obrigatoriedade legal de contratação de 998 mil pessoas com deficiência, mas com apenas 517 mil destas vagas, devidamente, preenchidas. O levantamento, divulgado pela Câmara Paulista para Inclusão da Pessoa com Deficiência foi feito a partir da base de dados do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, disponível, para usuários cadastrados, no painel de gestão do governo federal.
A Lei de Cotas é a principal garantia de emprego formal para as pessoas com deficiência no Brasil. “O cumprimento dela permite que avancemos na construção de uma sociedade diversa e inclusiva sob todos os aspectos, conforme preconizam os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável e a Convenção sobre os direitos das pessoas com deficiência, da Organização das Nações Unidas”, José Carlos do Carmo, auditor fiscal do Trabalho e coordenador da Câmara Paulista para Inclusão da Pessoa com Deficiência.
No mês que celebra os 33 anos da Lei de Cotas, a Praça das Artes, no centro de São Paulo, recebeu em 24 de julho a Feira Contrata SP – Pessoa com Deficiência. Neste mutirão de empregabilidade, com apoio da Câmara Paulista para Inclusão da Pessoa com Deficiência e do Centro de Apoio ao Trabalho e Empreendedorismo (Cate), estiveram presentes 40 empresas do Estado de São Paulo, que ofereceram 620 vagas para os candidatos presentes, munidos de documentação, incluindo laudo médico.
Evento reúne vozes pela inclusão da pessoa com deficiência
O evento comemorativo pelos 33 anos da Lei de Cotas para Pessoas com Deficiência também foi realizado na Praça das Artes, em 24 de julho. A atividade contou com representantes de órgãos públicos, sociais e privados que se reuniram para falar sobre os avanços, desafios e perspectivas para a inclusão da pessoa com deficiência no mercado de trabalho. Em seguida às falas dos palestrantes convidados, foi feita a homenagem às pessoas que têm atuação relevante no movimento da inclusão das pessoas com deficiência e a psicóloga Roberta Pontes fez a leitura da Carta de São Paulo. Ao final do encontro, o clima de alegria tomou conta dos cerca de 300 presentes, com o show de Luan Richard, deficiente visual, que, muito animado, elevou o espírito do público.
O cerimonial foi aberto com a ativista Marinalva Cruz, que destacou que, apesar dos mais de 30 anos de lei e dos avanços conquistados, ainda há muito a ser feito e que é importante as empresas saberem que, além de ter por direito o acesso ao mercado de trabalho, a pessoa com deficiência também contribui para a economia. “A pessoa com deficiência também é consumidora”, ressaltou.
José Carlos do Carmo, o Kal, auditor fiscal do Trabalho e coordenador da Câmara Paulista para Inclusão da Pessoa com Deficiência, afirmou que “a Lei de Cotas precisa continuar existindo enquanto houver a discriminação pouco inteligente por parte de quem ainda não contrata pessoas com deficiência”. Ele destacou que, hoje, as pessoas com deficiência ocupam diferentes postos de trabalho com competência e que a Carta de São Paulo em defesa da Lei de Cotas reafirma esse compromisso para garantir o cumprimento da legislação, porque a Lei, por si, não garante seu cumprimento, e por isso mesmo a fiscalização continua sendo tão necessária. “A luta continua, e já vamos começar a preparação do 34º aniversário da Lei de Cotas em 2025. Viva a Lei de Cotas!”
Ruth Pinto Marques da Silva, procuradora do Ministério Público do Trabalho (MPT), apresentou dados que comprovam o descumprimento da Lei de Cotas por parte de algumas empresas. Ela destacou que o MPT tem realizado ações judiciais e investigações sobre as justificativas infundadas apresentadas pelas empresas para não contratar pessoa com deficiência, e que considera um grande avanço o fato de que essas justificativas não estejam sendo aceitas mais. “A alegação de que o ambiente, os mobiliários, os recursos de tecnologia assistiva não estão disponíveis na empresa não são mais aceitas como argumento válido, pois desde a promulgação da Lei Brasileira de Inclusão (LBI) em 2015, foi assegurada a complementação da Lei de Cotas ao garantir a acessibilidade integral, inclusive atitudinal, no ambiente de trabalho, por parte das empresas”. Outro avanço apontado pela procuradora foi o recente posicionamento do Tribunal de Justiça do Trabalho (TJT) referente aos acordos coletivos que antes colocavam as cotas de Aprendizes e de Pessoas com Deficiência como pontos a serem negociados. “Todos os direitos assegurados pela Constituição devem ser respeitados nos acordos coletivos, e não haverá mais a possibilidade de reduzir a base de cálculo para a contratação de pessoas com deficiência”.
Anna Paula Feminella, secretária Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, reconheceu o município de São Paulo como referência na unificação de esforços para a inclusão da pessoa com deficiência, citando o exemplo da Câmara Paulista para Inclusão e a própria realização da comemoração da Lei reunindo tantos setores da sociedade. Ela mencionou também a Feira de Empregos, realizada como complemento da celebração do aniversário, com mais de 600 vagas e a participação 40 empresas como exemplos de iniciativas bem-sucedidas. A secretária também destacou a importância da 5ª Conferência Nacional de Políticas Públicas para Pessoas com Deficiência, que reafirmou o compromisso com a Lei de Cotas. “O programa federal Viver sem Limite 2 tem 95 frentes de ação em sua primeira etapa, e várias delas são metas que envolvem a empregabilidade. Temos sete ministros envolvidos diretamente nessas metas, que compõem o grupo com esse foco. A partir dessa mobilização, devemos criar uma Câmara Temática para garantir emprego e renda como caminhos para uma vida digna e autônoma”.
De acordo com Anna Paula, a deficiência está nas instituições e na falta de foco por parte das empresas para incluir, considerando as pessoas com suas especificidades e barreiras. “O problema não é nosso, é da sociedade que insiste em manter o padrão corpo normativo da produtividade, sem garantir a plena participação. Queremos estar em todos os lugares, inclusive nas pequeno e microempresas”, complementa.
Silvia Grecco, secretária municipal da Pessoa com Deficiência da cidade de São Paulo, enfatizou a importância da luta constante pela conquista e manutenção dos direitos da pessoa com deficiência. Ela citou a cidade de São Paulo como referência em políticas públicas para pessoas com deficiência, como a Feira de Empregabilidade e a política de cotas para pessoas com deficiência em concursos públicos. “Temos mais de 1,2 milhão de pessoas com deficiência na cidade de São Paulo, e elas precisam ser amadas, respeitadas e incluídas com práticas”, afirma.
Armando Jr., secretário adjunto da Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Trabalho da Prefeitura de São Paulo e idealizador do projeto Contrata SP, destacou o trabalho integrado com diversos parceiros para promover a diversidade e a inclusão no mercado de trabalho. Ele apresentou os resultados da 16ª edição do Contrata SP, e disse que, ao longo das 16 edições da Feira, foram disponibilizadas 17 mil vagas e 42 mil pessoas foram encaminhadas para vagas oferecidas. “Toda vez que uma pessoa consegue a contratação, ela passa a sair de casa, conviver com outras pessoas, se desenvolve, melhora sua renda e evolui. Temos como meta realizar dois mutirões de emprego por ano”., afirma
Marcus Alves de Mello, Superintendente Regional do Trabalho no Estado de São Paulo (SRT-SP), compartilhou sua experiência pessoal como pai de um filho com autismo. Ele destacou a importância da fiscalização, notificação e conscientização das empresas para o cumprimento da Lei de Cotas e a promoção da inclusão da pessoa com deficiência no mercado de trabalho, trazendo dados nacionais e estaduais.
Ermenegildo Pires Alves, Superintendente Regional do Sudeste 1 do INSS, ressaltou a missão do instituto em reconhecer direitos e oferecer benefícios assistenciais à pessoa com deficiência, e para todas as pessoas, em todas as fases da vida. Ele destacou a importância da reabilitação profissional para a reinserção da pessoa com deficiência no mercado de trabalho, e convidou as empresas a conhecerem e participarem do programa.
Marco Pellegrini, representante da Secretaria Estadual da Pessoa com Deficiência, relatou sua trajetória pessoal de luta pela Lei de Cotas. Ele destacou a importância dessa conquista para a inclusão da pessoa com deficiência no mercado de trabalho e a necessidade de continuar lutando por mais oportunidades e pelo fim do capacitismo.
Sobre a Câmara Paulista para Inclusão da Pessoa com Deficiência – Criada em 2011 por iniciativa da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de São Paulo (SRTE/SP), a Câmara Paulista para a Inclusão nasceu como desdobramento de um estudo realizado pela SRTE/SP sobre a opinião das entidades de promoção dos direitos da pessoa com deficiência em relação às prioridades no debate sobre a inclusão profissional no país. Inicialmente foram ouvidas cerca de 80 organizações da sociedade civil do Estado de São Paulo. Seu propósito é ampliar o acesso e a qualidade da inclusão profissional da pessoa com deficiência, por meio de ampla participação social e do fortalecimento da ação fiscal do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).