O voluntariado é uma prática que tem o poder de transformar comunidades e promover o bem-estar social, ao mesmo tempo em que é uma experiência de transformação interna para o voluntário. Costumo dizer que voluntariado não é somente uma prática de “doação de si”, mas também uma prática de “cuidado de si”. Voluntariado é uma forma de melhorarmos como seres humanos. Contudo, apesar dos impactos positivos tão evidentes, tanto para quem pratica, quanto para seus beneficiários, o cenário do voluntariado no Brasil ainda caminha para o amadurecimento.
De acordo com dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), apenas 4,2% da população brasileira declara que realizou trabalho voluntário em 2022. Embora haja um aumento na participação voluntária em comparação a anos anteriores, esse número ainda é relativamente baixo se compararmos a outros países.
E isso não quer dizer que o brasileiro não tenha um “espírito de voluntário”. Um dos principais desafios que explica esses dados da pesquisa, é que grande parte das pessoas que realizaram ações voluntárias pontuais, não se identificam como voluntários. Isso é fruto da crença de que voluntário é apenas quem realiza atividade fixa e regular em Organizações da Sociedade Civil (OSCs), entendimento dominante até há pouco tempo. Contudo, o que se vê nos últimos anos, por meio de pesquisas que realizamos na Parceiros Voluntários, e acompanhando outros movimentos do Terceiro Setor, é um entendimento de que as ações de voluntariado precisam se adaptar aos novos tempos; tempos em que vigoram relações mais efêmeras, intervenções mais bem delimitadas e a ampla difusão das plataformas online. Tais características são bem próprias da contemporaneidade.
Nesse sentido, é fundamental atualizarmos nossa linguagem e abordagem de comunicação, para tornar viável uma guinada de conscientização que propicie maior engajamento da população no exercício do voluntariado. A PV, juntamente com outras organizações, desempenha papel crucial na sensibilização da população sobre a importância do voluntariado. Por meio de campanhas educativas, eventos de sensibilização e programas avançados de voluntariado, conseguiremos mobilizar pessoas de todas as idades e origens para se conectarem de múltiplas formas a atividades voluntárias. E é justamente por isso que na Parceiros Voluntários temos focado nossas ações no advocacy pela nossa causa maior.
Pesquisa conduzida na Escola de Administração da UFRGS com nosso apoio, mostrou que a maior parte dos voluntários iniciam sua jornada por meio de escolas e empresas. Então está aí uma excelente oportunidade de aproveitarmos tais espaços para fomentar a cultura do voluntariado e a educação para a cidadania.
O voluntariado corporativo tem se destacado como uma estratégia eficaz para aumentar o engajamento dos funcionários em ações sociais de impacto. Muitas organizações estão incentivando seus colaboradores a dedicarem parte do seu tempo a atividades voluntárias, seja por meio de programas formais ou eventos de voluntariado. Essas iniciativas não só beneficiam as comunidades atendidas, mas também fortalecem o senso de propósito e satisfação dos funcionários (eis aqui o princípio do “cuidado de si”), contribuindo para um ambiente de trabalho mais positivo e engajado.
Além disso, a recente aprovação pela Organização das Nações Unidas (ONU) da resolução que estabelece 2026 como o Ano Internacional dos Voluntários para o Desenvolvimento Sustentável é um marco importante para o voluntariado no Brasil e no mundo. Isso significa que nos próximos três anos, 2024, 2025 e 2026, o voluntariado estará no centro das atenções globais, um movimento que aumentará a conscientização sobre a importância do voluntariado e a mobilização de recursos e apoio para iniciativas em todo o país.
Em suma, embora o cenário do voluntariado no Brasil ainda enfrente dificuldades, há também muitas oportunidades para promover uma cultura de solidariedade, através do fortalecimento das comunidades, na promoção da justiça social e na construção de um mundo mais inclusivo e sustentável. Ao enfrentar os desafios e explorar as oportunidades que se apresentam, poderemos trabalhar juntos por uma cultura voluntária que estimule a responsabilidade social individual, cidadã, e que impacte positivamente nosso país.
Abel Reis, Presidente do Conselho de Administração da Parceiros Voluntários, organização da sociedade civil com a missão de ampliar o conhecimento e a prática do voluntariado no Brasil. É formado em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Informática pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, com mestrado em Engenharia da Computação com ênfase em Inteligência Artificial pela UFRJ. Em paralelo, cofundou a primeira agência de propaganda digital do Brasil, a AgenciaClick, que, entre os anos 2000 e 2014, fez história no mercado nacional e internacional. É sócio fundador da Logun Ventures.