A startup Recici, fundada em 2017, surgiu com o objetivo de reciclar os resíduos eletroeletrônicos utilizando tecnologias sustentáveis para extrair metais nobres, como ouro, prata, níquel, paládio, manganês, cobalto, ferro, magnésio e lítio, presentes nesses resíduos, para na sequência, vendê-los para que sejam reutilizados no início da cadeia produtiva.
“As jazidas naturais, de onde as mineradoras retiram os metais que são utilizados na fabricação dos equipamentos eletrônicos, estão em esgotamento em todo o mundo por conta de um processo produtivo que não recicla e não é sustentável. Nesse modelo linear, cada etapa, como extração, transformação, comercialização, consumo e descarte, gera grandes impactos ambientais. A nossa solução de reciclar e reaproveitar metais a partir de resíduos visa reduzir esse impacto”, destaca Flávio Pietrobon, CEO da Recicli. Para além da extração dos metais, a reciclagem dos resíduos eletrônicos busca evitar os descartes incorretos em aterros, lixões, e até mesmo em espaços ao ar livre, o que contribui para a decomposição dos resíduos e a contaminação dos solos, do ar e da água. Atualmente, o Brasil recicla apenas 3% de seus resíduos eletrônicos, muito longe da média mundial de 17%.
O processo produtivo da empresa inclui a separação e o refino de metais nobres com um alto grau de pureza. De uma tonelada de equipamentos eletrônicos a empresa quer recuperar cerca de 50 quilos de metais nobres, o que gera um valor total superior a R$ 116 mil por tonelada. A Reciclo tem como meta o processamento de 4,5 mil toneladas por ano, o que projeta uma receita, com a venda dos metais nobres recuperados, de R$750 milhões ao ano. O objetivo é que, com o aprimoramento da tecnologia, essa capacidade de processamento dobre a cada dois anos, e que novas unidades também sejam construídas.
A tecnologia está sendo desenvolvida com a utilização de equipamentos de análise físico-química de alta precisão e da estrutura dos laboratórios do CDTN (Centro de Desenvolvimento de Tecnologias Nucleares). “Nossa tecnologia é uma solução ambientalmente sustentável, possui baixo uso de energia e não emite substâncias poluentes nem contaminantes, gasosas ou líquidas”, destaca Flávio. O CEO ressalta que as demais tecnologias em operação no mundo hoje são muito poluentes, como é o caso da lixiviação ácida, que libera líquidos poluentes em rios, e da termometalurgia, que libera na atmosfera contaminantes ambientais severos, na forma de gases.
Para a implantação da sua tecnologia, a empresa planeja, em parceria com corporações transnacionais, a construção de uma usina de processamento de resíduos eletrônicos, com pelo menos 40 colaboradores, em Belo Horizonte.
Manufatura Reversa e Logística Reversa
Desde que iniciou suas atividades, a Recicli tem aprimorado seus processos para aumentar o fluxo de suprimento dos resíduos eletrônicos. Desde 2020 estruturou a operação de manufatura reversa, que consiste na coleta, desmontagem, testagem e separação dos componentes de equipamentos eletrônicos. O processo permitiu, em três anos, a destinação adequada de 30 toneladas de equipamentos eletrônicos, separados em diferentes materiais e componentes para indústrias que os utilizam como insumos. “Agora, estamos em uma fase de implantação de novas tecnologias e processos para aumentar a produtividade da operação em uma nova linha de produção, além do aumento do espaço de armazenamento para dar conta de grandes volumes de carga. O objetivo é que a nova estrutura esteja pronta em dois meses”, destaca Flávio.
A empresa quer abrir inicialmente três centrais de pré-processamento nas cidades de Belo Horizonte, Salvador e Aracaju. Flavio aponta que a natureza da atividade de manufatura reversa é diferente da usina de reciclagem e, por isso, ela criou uma nova startup, a REEETurn, para centralizar essa operação. Com o objetivo de localizar e coletar os resíduos eletrônicos em grandes quantidades, a REEETurn desenvolveu uma plataforma digital para facilitar a identificação, a coleta e a logística desses resíduos.
“A REEEturn nasceu para estruturar a cadeia de suprimento desses resíduos eletrônicos, que a gente estava tendo dificuldade de fazer chegar em nossa operação. Com essa plataforma digital de logística reversa, pessoas físicas e jurídicas poderão se conectar e destinar resíduos eletrônicos a um dos centros de pré-processamento que também integram a operação da nova startup”, destaca.
Para além das centrais de pré-processamento, o objetivo da REEEturn é implementar uma nova plataforma digital instalada de fábrica nos equipamentos, operando com IoT, e permitindo que os equipamentos, mesmo danificados, sejam rastreados e coletados pela REEETurn. A plataforma se encontra neste momento em fase de teste e validação, prestes a estar disponível nas lojas de aplicativo Android e IOS. “Apesar de ser uma startup com equipe e CNPJ próprio, a razão de existir da REEETurn é direcionar todo material coletado e pré-processado para a usina de reciclagem da Recicli”, salienta Flávio.
Expansão para outras cadeias industriais
Através da participação no Programa FIEMG Lab 4.0, da Federação das Indústrias de Minas Gerais (FIEMG), a Recicli foi convidada a adaptar sua tecnologia para a reciclagem de baterias de carros elétricos e para a reciclagem dos resíduos da mineração e da siderurgia. Após a adaptação, a empresa passou então a direcionar seu modelo de negócio e sua tecnologia para a recuperação de metais nobres a partir dos resíduos industriais de várias cadeias industriais.
Em 2020, a Recicli foi demandada a customizar sua tecnologia para o reparo, o reuso e a reciclagem de baterias de carros elétricos. Além disso, a empresa também foi demandada para a customização da tecnologia de recuperação de metais para a reciclagem de escória siderúrgica e de rejeitos da mineração. “As taxas de recuperação dos metais nobres a partir destes resíduos pela tecnologia da empresa são expressivas e projetam um potencial de crescimento e de geração de resultados financeiros exponenciais”, ressalta Flávio.
Trajetória e resultados
A Recicli foi incubada no Parque Tecnológico de Sergipe (SergipeTec), acelerada em duas rodadas pelo FIEMG Lab 4.0., foi reconhecida em premiações como o Stellantis Venture Awards (Global Prize) 2023, o 100 Open Startups em 2023 (entre as 5 melhores startups de inovação para indústrias) e em 2022 (entre as 10 melhores startups de saneamento), e selecionada entre as 10 startups do Demo Day Braskem Labs 2022, além de ter participado do SEBRAE StartUp Nordeste 2022/2023 e Open Mind Academy edição 2023.