Roberta Negrini é figura influente nos setores da moda, inclusão social e negócios de impacto, além de fundadora do Movimento Eu Visto o Bem, que busca ressignificar a indústria têxtil, levando sustentabilidade e buscando oportunidades de trabalho e reintegração para mulheres em situação de vulnerabilidade.
Após uma carreira como executiva de multinacionais, Roberta acabou se apaixonando pela área têxtil, algo causado não pelo glamour ou design do setor, mas em razão do entendimento de que a moda poderia ser uma alavanca de transformação social. “Vivemos num mundo que cultua muito as passarelas, e o volume financeiro que se tem por meio disso é bilionário, então por que não usar essa cultura para incentivar a transformação social? Acredito que as empresas deveriam existir para curar as dores da sociedade. Eu me apaixonei pela oportunidade de transformar vidas por meio da moda”, conta.
Gerir uma empresa que tem propósitos sociais tão fortes quanto o Movimento Eu Visto o Bem é um desafio, segundo Roberta, que considera que a indústria da moda ainda é muito primitiva. “Por ser muito manual, é uma indústria que tem poucos recursos tecnológicos, muito desperdício, poucos processos, muita terceirização e quarteirização”, afirma.
Ela ressalta que se trata de uma indústria exploradora. “A gente está falando de uma indústria onde, na ponta, existe um glamour muito grande. Existe uma riqueza e um empoderamento gigantesco e aí, nesse caso, vemos a concentração de riqueza na mão dos homens e um trabalho desumano na mão das mulheres. A produção está toda focada na mulher, enquanto a liderança do setor têxtil está na mão dos homens. Ou seja, existe um desequilíbrio de gênero gigantesco e, obviamente, por ser muito manual, ela acaba ganhando espaço em lugares subdesenvolvidos, ou seja, países que empregam em regimes análogos à escravidão ou pagando muito pouco”, analisa.
Ela exemplifica o cenário. “Você tem de um lado uma marca super sofisticada que está nas redes sociais vendendo glamour e cobrando, por exemplo, R$ 1.500,00 em um vestido, mas ela paga apenas R$ 8,00 ou R$ 9,00 pela costura desse vestido, entende? Ou seja, é uma cadeia desumana”, reflete.
Outro ponto desafiador citado por Roberta é a questão do desperdício. “É uma indústria onde o design, a sofisticação e a vaidade contam mais do que as questões ambientais e sociais. Já vi várias vezes um estilista não aprovar uma tonelada de tecido têxtil porque o pantone não estava adequado com a cor da estação. Esse excesso de vaidade faz com que a gente tenha um um excesso de produção, de desperdício, e uma rotatividade que gera uma quantidade de produtos de pós consumo gigantesco”, explica. “No pós consumo, aliás, com a qualidade das peças cada vez pior, a gente usa um produto por quatro, cinco, seis vezes e já tem que descartar. Com isso, estamos destruindo o nosso ecossistema inteiro”, alerta.
Para Roberta, o Movimento Eu Visto Bem anda na contramão do modus operandi da indústria têxtil. “Nosso ponto de partida é gente, então, antes de mais nada, nosso grande ativismo e razão de existir é empregar, é gerar renda, ressocialização e diminuição da criminalidade para a sociedade, ou seja, somos uma empresa curativa, que cura as dores de uma sociedade que tem mulheres invisibilizadas dentro do sistema carcerário. Esse é um ponto do movimento que é completamente divergente da indústria, já que priorizamos pessoas ao invés de produtos”, ressalta.
A executiva também cita o respeito ambiental existente nos fundamentos do Movimento. “Somos extremamente rigorosos nisso, trabalhando com matérias primas circulares. Ou seja, 100% do que a gente produz já foi um dia garrafa pet ou resíduo têxtil, e quando uma marca escolhe produzir com a gente, ela tem a garantia de que não está deixando lixo têxtil em nenhum lugar do planeta porque a gente faz todo o processo correto na cadeia para que esses produtos voltem para o início do ciclo e possam virar tecido novamente”, finaliza.