sexta-feira, julho 26, 2024

CCUS: o pilar mais estratégico na transição energética para o Brasil

Compartilhar

À medida em que o mundo continua a lidar com a necessidade urgente de enfrentar as mudanças climáticas e reduzir as emissões de carbono, as tecnologias de Captura, Utilização e Armazenamento de Carbono (CCUS) emergem como algo crucial e com significativas perspectivas para o Brasil. Com seus vastos recursos naturais, diversos setores industriais e o compromisso com o desenvolvimento sustentável, o país pode assumir, na próxima década,  uma posição de destaque na utilização dessas tecnologias para mitigar as emissões de gases de efeito estufa e acelerar a transição para uma economia de baixo carbono.

O Brasil possui um potencial imenso para a implantação de CCUS em múltiplos setores, incluindo energia, petróleo e gás, manufatura e agricultura. Segundo um estudo recente da Mckinsey & Co, o mundo precisa que o país descarbonize, não apenas porque é o sétimo maior emissor de gases de efeito estufa do mundo, mas também porque está posicionado de forma única para se tornar uma potência de apoio à transição energética global.

Aqui, são emitidas cerca de 2,2 gigatoneladas de dióxido de carbono equivalente (GtCO2eq) a cada ano – metade das quais provém do desmatamento, sendo um quarto do setor agrícola, um quinto do transporte e energia, e o restante da indústria e resíduos. Cerca de 80% dessa situação, ocorre no bioma Amazônico, impulsionado, principalmente, por iniciativas ilegais associadas a um ciclo complexo de grilagem de terras públicas. Para se tornar uma potência em sustentabilidade, o Brasil deve reduzir significativamente este problema e abordar a legislação de propriedade de terras.

Importante destacar que vários fatores contribuem para as perspectivas favoráveis de CCUS por aqui. O país conta com uma enorme abundância de fontes de carbono, incluindo usinas de energia, instalações industriais e operações agrícolas. Essas fontes apresentam inúmeras oportunidades para captura e utilização de CO2. Além disso, existem vastas extensões de florestas, áreas úmidas, entre outros ecossistemas naturais que atuam como sumidouros de carbono. A preservação e restauração são fundamentais para sequestrar carbono da atmosfera.

Em segundo lugar, há um setor de energia desenvolvido e abrangente, caracterizado por uma diversidade de fontes de geração, sendo hidrelétrica, eólica, solar e baseada em combustíveis fósseis que, certamente, oferecem aplicações potenciais para CCUS. As tecnologias de captura de carbono podem ser integradas às usinas de energia baseadas em combustíveis fósseis para reduzir as emissões e melhorar a sustentabilidade ambiental. A Petrobras, por exemplo, tem investido em várias iniciativas interessantes. A empresa tem injetado CO2 para recuperação avançada de petróleo (EOR) em seus campos de águas profundas desde 1987.

A empresa desenvolveu diversas embarcações de produção, armazenamento e descarga flutuantes (FPSO) que capturam CO2 da produção de gás natural e o reinjetam nos reservatórios produtores. As injeções de CO2 ajudam a manter um platô mais longo de produção de petróleo e evitam a emissão de milhões de toneladas de CO2 para a atmosfera. A Petrobras tem um dos maiores projetos de CCUS em operação no mundo, com uma capacidade total de injeção de CO2 de cerca de 5 milhões de toneladas por ano.

Somado a isso, o país vem buscando ativamente colaboração e parcerias internacionais com o objetivo de mitigar as mudanças climáticas e ampliar o desenvolvimento sustentável. Há, ainda, um ecossistema de pesquisa e inovação, apoiado por instituições acadêmicas, organizações de pesquisa e iniciativas governamentais, fomentando o desenvolvimento e a implantação de tecnologias CCUS. Apesar destes avanços, o país enfrenta diversos desafios.

Um dos mais importantes refere-se às políticas públicas e regulamentações adequadas para acelerar e promover novos investimentos, principalmente as destinadas à energia renovável, implementação do mercado de crédito de carbono, incentivos para redução de emissões e gestão ambiental. O sucesso destas iniciativas está diretamente relacionado com a capacidade do Governo e agências reguladoras em promover um ambiente de negócios favorável, com previsibilidade, estabilidade e segurança jurídica.

Outro desafio diz respeitos a recursos para financiamento. Os projetos de CCUS demandam altos custos de capital, sendo assim, exigem mecanismos robustos de investimento e financiamento. Parcerias público-privadas, mecanismos de precificação e/ou aceleração da regulamentação do mercado de crédito de carbono, além de incentivos para implantação de tecnologia, podem facilitar e acelerar os financiamentos.

Adicionalmente, vale destacar a necessidade de infraestrutura de transporte e armazenamento de CO2, que é essencial para a implantação eficaz dessas tecnologias. Investimentos em redes de dutos, locais de armazenamento e sistemas de monitoramento são necessários para apoiar a implantação em larga escala e garantir a integridade operacional. Atualmente, o país possui uma malha dutoviária bastante limitada para o transporte de CO2. A infraestrutura existente é voltada para o transporte de petróleo, gás natural e biocombustíveis, com pouca capacidade dedicada ao transporte específico de CO2 para fins de captura e armazenamento.

Outro ponto de grande relevância diz respeito à integração tecnológica e ganhos de escala. De fato, integrar tecnologias CCUS em processos industriais existentes e instalações de geração de energia, requer planejamento cuidadoso e profunda expertise em engenharia. Escalabilidade, eficiência e compatibilidade com a infraestrutura existente são considerações extremamente relevantes na implantação desta tecnologia.

O alinhamento de políticas nacionais, marcos regulatórios e incentivos com objetivos climáticos de longo prazo são essenciais para criar um ambiente favorável à implantação de CCUS. Regulamentações claras, consistentes e certezas regulatórias, fornecem o quadro necessário para investimento e inovação. Assim, existe a expectativa de que o projeto de lei 1425/2022, que tramita na Câmera dos Deputados, possa ser um primeiro passo.

Além disso, a conscientização da sociedade e o engajamento das partes interessadas são fundamentais para promover a aceitação e o apoio a estes projetos. Comunicação transparente, envolvimento da sociedade e iniciativas educacionais, podem abordar preocupações relacionadas à segurança, impacto ambiental e conformidade regulatória.

As tecnologias CCUS têm um potencial imenso como uma estratégia-chave de mitigação das mudanças climáticas no Brasil. Ao aproveitar suas abundantes fontes de carbono, sumidouros naturais, setor energético estratégico e parcerias colaborativas, o país pode se posicionar como líder em inovação e implantação destes projetos. Abordar desafios relacionados à investimento, infraestrutura, integração tecnológica, engajamento público e alinhamento de políticas, será crucial para realizar todo o potencial dessa oportunidade, tornando o Brasil um dos líderes na transição para um futuro de baixo carbono e muito mais sustentável, garantindo um ambiente melhor para as gerações futuras. Top of Form

Felipe Kury, ex-diretor da ANP – Agência Nacional de Petróleo e Managing Partner na FK Energy Partners.

Leia Mais

Outras Notícias