sexta-feira, julho 26, 2024

Diversidade no ambiente de patentes: uma área da inovação que tem muito a ganhar com equidade e inclusão

Compartilhar

A importância e a rentabilidade da diversidade já são conhecidas pelas empresas. Um estudo realizado pela McKinsey & Co. mostrou que, em 2019, as empresas com maior diversidade em termos de gênero nas áreas executivas tinham 25% mais chances de ter uma lucratividade acima da média do que as empresas com menor diversidade.

No entanto, quando olhamos para a diversidade na esfera das patentes, um relatório publicado pela OMPI mostrou que, em 2021, as mulheres representavam apenas 16,5% de todos os inventores listados em pedidos PCT. Ao olhar para as regiões geográficas do mundo, a América Latina e Caribe estão um pouco melhores (22,9%), tendo a maior proporção de mulheres entre os inventores do PCT, seguida por Ásia (17,3%), América do Norte (16,4%), Europa (14,8%), Oceania (14,1%) e África (12,3%). Ainda assim, esses números estão longe do ideal.

Infelizmente, a invenção não é o único campo afetado pela falta de diversidade, equidade e inclusão no ambiente de patentes. Embora não tenhamos números globais sobre profissionais que trabalham diretamente com patentes, dados da American Bar Association mostram que, nos Estados Unidos, apenas 22% desses profissionais registrados são mulheres, 6,5% são racialmente diversos e somente 1,7% são mulheres racialmente diversas.

Considerando todos estes números e o resultado do levantamento realizado pela McKinsey & Co., é possível concluir que uma considerável rentabilidade que poderia ser gerada pela diversidade nas atividades relacionadas a patentes não está sendo concretizada. É importante ressaltar que a pesquisa da McKinsey & Co. teve como foco a diversidade de gênero e a diversidade étnica e cultural na liderança corporativa, o que não reflete toda a pluralidade da diversidade, ou seja, o potencial das empresas ganharem com esse atributo é ainda maior.

Iniciativas globais que merecem destaque

Em 2021, surgiu uma ação, por parte de algumas empresas, a partir da conscientização sobre a relevância da diversidade na inovação, a Declaração de Diversidade (Diversity Pledge), um compromisso para compreender e abordar a questão dos inventores sub-representados. Esta é uma iniciativa do Aumento da Diversidade na Inovação (Increasing Diversity in Innovation – IDII), onde as empresas aderidas são apoiadas por escritórios de advocacia e empresas não tecnológicas. O IDII, juntamente com a Aliança de Propriedade Intelectual dos Estados Unidos (United States Intellectual Property Alliance) e o Instituto de Patentes dos EUA, por meio do Conselho para Inovação Inclusiva (Council for Inclusive Innovation – CI2), organizaram a 2ª Conferência Anual em agosto de 2023, discutindo as melhores práticas nas profissões para aumentar a Diversidade, Equidade, Inclusão e Acessibilidade (Diversity, Equity, Inclusion and Accessibility – DEIA) no ecossistema de inovação e inventividade.

Grandes empresas de tecnologia preocupadas com a diversidade na inovação, como Meta, Google e Microsoft, criaram, também em 2021, um grupo para Promoção da Diversidade entre as Equipes de Patentes (Advancing Diversity Across Patent Teams – ADAPT), focado em aumentar a diversidade, a equidade e a inclusão nas profissões relacionadas a patentes. Nesse sentido, por exemplo, a Meta fez uma parceria com o National Council for Patent Practicum (NCPP), uma organização sem fins lucrativos dos Estados Unidos, para prover formação gratuita a mulheres e outras minorias sobre como redigir e administrar pedidos de patentes perante o Instituto de Patentes dos EUA, e também implementou um chamado “Brainstorming híbrido” para eliminar problemas com vieses dos processos tradicionais de criação de patentes para aumentar a diversidade de seus inventores. No Brainstorming híbrido, os participantes podem mostrar de forma anônima e individual suas ideias de solução para problemas técnicos. Essa ação restringe o foco nos méritos de cada ideia, desconsiderando características pessoais e evitando preconceitos implícitos de gênero, cor ou etnia. Isso também empodera os funcionários a apresentarem suas ideias sem medo de julgamento e independentemente do nível de senioridade.

Panorama Brasileiro

No Brasil, o artigo “A presença de mulheres na atividade de patenteamento no Brasil (1996-2017)”, de 2021, revelou que a proporção de mulheres entre todos os inventores nas patentes atingiu 19% de 2011 a 2015. Os autores mencionaram que há uma ampla consenso sobre o potencial inexplorado de contribuições de mulheres cientistas e engenheiras para o desenvolvimento de tecnologias no Brasil e, no caso de atividades de patenteamento, a desigualdade de gênero brasileira segue a tendência mundial, onde o crescimento da participação feminina neste campo tem sido lento.

Por outro lado, o Brasil tem empresas e universidades obtendo bons resultados em inovação por meio da promoção da diversidade, da equidade e da inclusão. Dentre os maiores depositantes de patentes brasileiros no Brasil em 2022, há quatro bons exemplos: 1) A Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) constatou que, entre 2017 e 2021, 87% dos pedidos de patentes depositados pela instituição tiveram pelo menos uma mulher listada entre os inventores; 2) A Petrobras, uma das maiores empresas petrolíferas do mundo, é signatária do pacto global da ONU desde 2003, e neste ano (2023) criou uma gerência à gestão da diversidade, equidade e inclusão; 3) A CNH recebeu prêmios em reconhecimento às boas práticas na promoção da diversidade e inclusão nos últimos anos; e 4) A fábrica brasileira da Stellantis (Grupo FCA) é uma das mais tecnológicas e prósperas do grupo no mundo, e a chefe global do modo de produção, uma brasileira, vê que o sucesso desta unidade está diretamente atrelado à diversidade e ao protagonismo dos funcionários.

Da minha própria perspectiva, refletindo sobre o período em que estudei engenharia na universidade, descobri que havia uma percepção comum de que contribuições humanas importantes não eram aproveitadas em um ambiente predominantemente masculino e branco. Quando comecei a trabalhar com patentes e inovação em um local com equidade de gênero, lideranças femininas inspiradoras, e oportunidades de interagir com pessoas com diferentes vivências e pontos de vista, foi possível perceber as valiosas contribuições humanas que faltam em locais sem diversidade. As pesquisas e estudos aqui apresentados demonstraram e mensuraram a perda de rentabilidade e a magnitude da falta de diversidade na inovação e no domínio das patentes.

Conclusão

A inovação abrange atividades de patenteamento e a diversidade também deve ser não só incluída como também abraçada nesta esfera. Foi possível perceber que as iniciativas nesta área estão apenas começando e ainda não refletem todas as possibilidades, resultados e potencialidades dentro da pluralidade da diversidade. Mesmo assim, já confirmaram que perdemos muito sem a multiplicidade de pessoas nesses lugares e indicaram o caminho a seguir para aumentar a eficiência e a rentabilidade no desenvolvimento de tecnologias, trazendo benefícios para as empresas, a sociedade e o meio ambiente.

Camila Conegundes, especialista de Patentes da Daniel Advogados.

Leia Mais

Outras Notícias