Desde o último ano, o Brasil vem trabalhando em mudanças que devem reforçar a importância e a necessidade da equidade salarial entre homens e mulheres que ocupam o mesmo cargo nas empresas. Ainda em 2023 vimos mudanças importantes com o Decreto nº 11.795/2023, que regulamenta a Lei 14.457/2022, e estabelece a obrigatoriedade de igualdade salarial entre mulheres e homens.
Agora, um novo decreto reforça ainda mais a importância e a necessidade da equidade salarial, aplicada a empresas que possuem mais de 100 colaboradores. Essas companhias têm até o dia 29 de fevereiro para preencher o Relatório de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios referente ao 1º semestre de 2024, regulamento pelo referido Decreto.
Além de trazer obrigatoriedade para um tema tão relevante, esse movimento também reforça a necessidade de um olhar atento às práticas de ESG (Environmental, Social and Governance) nos negócios, A equidade salarial, inclusive, é uma pauta recorrente quando se fala em desenvolvimento social, sendo prevista, inclusive no Objetivo e Desenvolvimento Sustentável (ODS) número 5, da ONU.
A avaliação da igualdade salarial é o ponto de partida para entender onde estão os pontos de melhoria em relação ao desenvolvimento profissional dos colaboradores de uma empresa. Ele traz luz a vários aspectos que englobam uma estratégia de ESG sob o aspecto da governança, tornando um negócio mais justo, com mais oportunidades de crescimento e perenidade das relações de trabalho.
Proporciona, ainda, a análise e criação de ações para um ambiente igualitário em oportunidades, seja proporcionando o acesso a cursos, criação de plano de cargos e salário até condições para acesso a promoções, resultando assim um ambiente de equidade e de oportunidades.
A relevância do tema é evidente quando olhamos para a condição atual do país no contexto da equidade salarial. Segundo o IBGE, em 2022 houve um aumento de 22% em relação à diferença de remuneração entre homens e mulheres. Ainda de acordo com o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o rendimento mensal das mulheres é 21% menor do que o dos homens.
O relatório de transparência regulamentado pelo Decreto nº 11.795/2023 não é apenas uma obrigatoriedade do ponto de vista legal, mas uma importante ferramenta que auxilia nesse mapeamento das ações de governança da companhia e contribui para a redução dessa desigualdade. E é também uma prestação de contas social, além de uma forma de fiscalização das práticas corporativas.
As informações do relatório serão cruzadas com os dados já incluídos pelas empresas no e-Social. Por isso quaisquer atualizações cadastrais precisam ser informadas, incluindo as iniciativas que apoiam a contratação de mulheres, assim como a promoção delas na corporação.
O não preenchimento do relatório é passível de punições como multa administrativa – correspondente a até 3% da folha de salários do empregador, limitado a 100 salários-mínimos, além das sanções relativas à discriminação salarial. O Ministério do Trabalho conta, inclusive, com um canal de denúncias, que pode ser acessado por qualquer cidadão, incluindo profissionais que sintam-se prejudicados neste contexto de disparidade salarial.
O relatório precisa, ainda, ser publicado pela empresa nos seus canais de comunicação (site e/ou mídias sociais, como Facebook, Instagram e LinkedIn) entre os meses de março e setembro. Portanto, deve ser um documento público e que vai ampliar a imagem da empresa perante seus stakeholders.
Importante lembrar que essas estratégias de ESG estão cada vez mais no centro das análises e discussões de investidores que apostam em grandes players e por consequência, estes olham para sua cadeira produtiva, fazendo com que o impacto chegue em todos os portes de empresa. E tudo aponta que o Relatório de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios irá ser uma aliada nessas análises de investimento.
Para que as empresas avancem do estágio de cumprimento legal para a maturidade de estratégia ESG é preciso que seja trabalhado também a cultura da Sustentabilidade em todas as esferas do negócio. Implementar o relatório é um passo importante, mas é também um primeiro passo para a criação de ações efetivas, que promovem a governança e o crescimento sustentável do negócio.
Sharon Koepsel, especialista em ESG do escritório de direito empresarial Flávio Pinheiro Neto Advogados.